Título: ARTIGO - Nunca imaginei sambar na avenida
 
Márcio C Medeiros

Foi uma experiência fantástica ter a oportunidade de desfilar na Avenida numa escola de samba. Admito que nunca fui considerado um folião de primeira linha, e muito menos um sambista exemplar. O convite surgiu de forma descompromissada, quando tive a oportunidade de participar da Bagunça do Circo no Tênis Clube, ao fazer parte pela terceira vez, de um bloco carnavalesco formado por conhecidos. Eu e minha esposa Liza, como os demais, manifestamos o interesse em reforçar a Escola de Samba Unidos do Bonfim, nos dois dias de desfile na Avenida Sampaio Vidal, no centro da cidade.

No sábado a noite nos preparamos e com as nossas fantasias chegamos até o local onde todos se concentravam para sair sambando na Avenida. Confesso que pela primeira vez, estava bem cauteloso, preocupado com as improvisações, o empurra-empurra e aquelas confusões de praxe com pessoal pra lá de animado. Puro engano. Fiquei surpreso com a organização das escolas, com o comportamento dos sambistas que desfilaram e principalmente com a tranqüilidade de todos, não vendo nenhuma confusão fora do normal. Vi que o local era de concentração, mesmo. Somente a tensão e ansiedade pelo começo do desfile.

Liza e eu nos sentimos meio perdidos, pois de todos os nossos colegas que se comprometeram, nenhum deles apareceu. Daí outra surpresa: a receptividade do pessoal da escola de samba que fazia parte da nossa ala, a Ala do Fogo. Com os conhecidos de vista, veio o bate-papo que rolou de forma agradável, até começar o desfile que foi super tranqüilo, e neste momento o frio na barriga tomava conta por alguns minutos, dissipado com o passar dos minutos. Imaginei que seria muito mais difícil, principalmente por não saber sambar, desfilar e num ambiente bem diferente do meu normal, porém, num local dos mais agradáveis, porque percebi que quase todos encontravam-se na mesma condição que eu e Liza, ou seja, estávamos todos na mesma situação.

Por alguns instantes comecei a refletir. Quanto eu tinha 15 anos adorava participar das matinês e não via a hora de poder participar dos bailes noturnos. A partir dos 18 anos de idade, passei a freqüentar até os 20 anos, os bailes durante a madrugada, mas sempre sem muito envolvimento, pois nunca fui de beber e bagunçar. Sempre fui comedido. Há mais de 20 anos não brincava o carnaval como desta vez, pois, além de ir ao baile da Bagunça do Circo no Tênis Clube (temporão e único), ainda estive na Avenida desfilando numa escola de samba, algo inimaginável para mim, até então. É muito para uma pessoa pacata como eu. Pode parecer bobagem, mas foi um esforço próprio de quebra de paradigma em minha vida, além de reformar minha opinião sobre o carnaval de uma forma geral, pois, já passei a imaginar como é um desfile em sambódromos e o que isso pode representar para um povo. Passei a compreender a essência do carnaval.

Sei que Carnaval é o momento que temos de ser o que normalmente não somos, mas pude ser o que sou numa situação inusitada e prazerosa. Respeitei e fui respeitado. Não exigi nada e nada exigiram de mim. Talvez essa fórmula seja das boas, porque tudo deu certo de forma natural-normal como sempre defendo que deva ser nossos comportamentos. Nada foi forçado e eu pude ser eu mesmo, numa situação em que jamais imaginei. Melhor ainda: com pessoas agradáveis, ao lado da mulher que amo, com diversão garantida, sem abusos, sem agressões, sem estímulos artificiais, somente na base do prazer. Realizei dois sonhos: o meu e o da Liza em desfilar pela Avenida, na cidade onde moramos, ou seja, nos expondo aos amigos e conhecidos (que não são poucos), numa situação bem diferente do nosso normal.

Quero parabenizar a Escola Unidos do Bonfim pela boa demonstração que passou a mim sobre a idéia de uma Escola de Samba. Estendo os elogios a Secretaria Municipal de Cultura e Turismo de Marília, organizadora do desfile, pela demonstração de organização, infra-estrutura e condição para que o Carnaval não passe em branco, pois, da mesma forma que surpreendi muitas pessoas que acenavam para mim na Avenida, fiquei surpreso pela minha capacidade de enfrentar situações diferentes e ver que é possível ser feliz em locais em que muitas vezes se quer imaginamos. Estou orgulhoso de ter evoluído, e passo a ser um admirador do carnaval de Rua. Vi como é de dentro para fora, porque já estive na Avenida assistindo os outros, e querendo entender o que motivava as pessoas a desfilarem numa escola de samba. Agora eu sei: felicidade. A partir de agora tenho outra opinião sobre: o carnaval, as escolas de samba e o poder de ver que é muito fácil ser mais feliz, desde que estejamos preparados para as mudanças.

Márcio C Medeiros, é radialista e jornalista.
E-mail: marcio@medeiros.jor.br
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